Descrição
Publicado originalmente em 1991, El río sin orillas, do escritor argentino Juan José Saer (1937-2005), configura-se como uma obra bastante singular dentre a vasta produção do autor: ainda que admita não se tratar de obra “voluntariamente ficcional”, Saer recusa reiteradamente reconhecê-lo como ensaio, preferindo antes a denominação esquiva de “tratado imaginário” e descrevendo-o como um “híbrido sem gênero definido”. No presente artigo, propõe-se a análise do polêmico e incômodo capítulo “Invierno”, de El río sin orillas, no qual se acentuará uma linha bastante pronunciada que distanciará a voz do ensaísta da voz do escritor de ficções. Em “Invierno”, a história da formação da sociedade argentina, bem como a história recente do país são revistas a partir de um posicionamento específico, pelo qual o autor se insere polemicamente no campo político argentino, inclusive às custas da verve literária do texto que predomina no restante do livro. A leitura de “Invierno” será contrastada com alguns relatos ficcionais de Saer, de modo a evidenciar-se a diferença de tratamentos do topos da violência e da política na ficção e no ensaio. Espera-se, por um lado, que este trabalho permita uma aproximação crítica a questões nucleares do projeto estético saeriano, mas também, e por outro lado, que torne possível uma reflexão mais ampla acerca das tensões envolvidas nas disputas pela memória do passado recente argentino e da forma como o ensaio é convocado a participar desse conflito.